Se liga, que o tal ‘perdeu playboy’ pode dar cadeia, sim. Uma mensagem que circula pelas redes sociais anunciando que o Supremo Tribunal Federal (STF) teria “liberado” o roubo de celulares que custassem menos de R$ 500 é falsa.
“Para conhecimento. O ‘ perdeu playboy ‘ tá liberado. Quem rouba celular que custa menos que 500 reais não é preso, nem em flagrante, decide STF. E se custar mais de 500 reais, é solto na audiência de custódia. Bom, nós estamos nas mãos dos bandidos deste País”, afirma a mensagem.
No entanto, o conteúdo desse texto não traduz a realidade. Abaixo disso, ele é uma interpretação errônea de uma decisão do STF sobre um caso em específico, ocorrido em Minas Gerais.
No caso, o STF decidiu, em maio, pela extinção de uma ação em que um homem havia sido condenado a um ano de reclusão em regime semiaberto e ao pagamento de uma multa, devido ao furto de um celular, em 2011. Vale lembrar que furto é diferente de roubo.
Na época, a vítima havia informado que o celular teria lhe custado R$ 90.
No decorrer do processo, o criminoso foi absolvido em segunda instância pelo Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJ-MG), com base no princípio da insignificância ou da bagatela, em razão do baixo valor do celular furtado.
No entanto, houve um recurso ao Superior Tribunal de Justiça (STJ), que mandou o Tribunal de Justiça de Minas Gerais afastar da decisão o princípio da insignificância.
Em seguida, a defesa do homem recorreu ao próprio STJ, mas perdeu, e um novo recurso levou o caso ao STF – o último grau de instância de julgamentos no Brasil –, que decidiu, em maio deste ano, pela extinção do caso.
Falsa interpretação
Como se fosse em um telefone sem fio, a notícia divulgada em maio, sobre o caso específico relatado acima, sofreu alterações, até chegar ao texto que vem sendo compartilhado no Facebook e no WhatsApp.
Como se vê, não se trata de uma decisão geral, mas específica. Além disso, o caso é relacionado a um furto, não a um roubo.
A diferença entre furto e roubo é que, no primeiro, a subtração de coisa alheia ocorre para si ou para outrem sem o ‘emprego de grave ameaça ou violência’.
Ou seja, se alguém chega dizendo à vítima “perdeu, playboy” – como exemplifica a mensagem –, e toma-lhe à força o celular, é um roubo. Com ou sem arma, pois a ameaça e a violência se configura na própria abordagem intimidadora.
Um furto, por exemplo, seria a ação de batedores de carteira, celulares que desaparecem dentro de lugares lotados ou a subtração de móveis de um apartamento invadido por bandidos, enquanto ninguém está em casa. Um crime mais sorrateiro e menos violento.
Outro ponto a ser desmentido na mensagem é a especificação do valor de R$ 500, que não possui referência. O caso que gerou a mentira tratou de um celular de R$ 90.
Princípio da insignificância
Mesmo assim, o chamado princípio da insignificância gera posições opostas entre quem trabalha na área jurídica.
Embora a corrente não trate de uma notícia verdadeira, o princípio da insignificância foi aplicado a um caso relativo a um celular de R$ 90.
O termo é utilizado para designar crimes considerados desprezíveis e que não valem uma investigação, no sentido de acionar a lei penal. O objetivo é desafogar o sistema carcerário, que deve servir apenas para prender criminosos ligados a roubos de alta periculosidade.
Além disso, tal princípio só pode ser aplicado a furtos, porque a violência e a ameaça que precedem um roubo são tidos como de valor indeterminável.
No entanto, há quem defenda que o furto de R$ 1 e o furto de R$ 1 milhão possam ser igualmente puníveis.
A questão é que, em casos de furtos de celulares, no famoso ‘perdeu playboy’, a Justiça seguirá avaliando caso a caso. Ou seja, quem furta ou rouba um celular de R$ 500 pode ser preso e condenado sim e não tem garantia alguma de soltura depois de uma audiência.