O contato com a natureza traz uma série de benefícios para a saúde física e mental, como alívio do estresse, aumento da concentração, relaxamento corporal, incentivo ao autoconhecimento e estímulo à curiosidade. No entanto, quem vive em áreas urbanas pode ter dificuldades para acessar todos esses benefícios com a frequência ideal. Para suprir esse déficit de verde no dia a dia, é possível criar estratégias que tragam a natureza para dentro de casas e apartamentos, mesmo com pouco espaço disponível.
O professor do Departamento de Botânica da Universidade Federal do Paraná (UFPR) e membro da Rede de Especialistas em Conservação da Natureza (RECN), Paulo Henrique Labiak Evangelista, lembra que muitas espécies de plantas podem ser cultivadas em calçadas, quintais, terraços, sacadas, janelas e até paredes. “As plantas trazem aparência mais agradável aos ambientes, promovendo um sentimento de tranquilidade e bem-estar. Cuidar de plantas também pode ser uma atividade lúdica importante, que contribui para melhorar a saúde mental. Em tempos nos quais os problemas psicológicos são tão desafiadores, pode ser uma atividade terapêutica muito recompensadora”, explica.
As plantas são a base da cadeia alimentar de muitas espécies de animais e, ao cultivá-las em áreas urbanas, também é possível atrair aves, borboletas, outros insetos e pequenos animais, ampliando a biodiversidade nas cidades. “Quanto mais espécies de plantas conseguirmos agregar nas áreas urbanas, por consequência teremos maior suporte alimentar para mais espécies de animais. Todos têm a ganhar com mais verde por perto”, ressalta o pesquisador.
Confira seis dicas para trazer um pouco mais de contato com a natureza para sua casa ou apartamento.
1 – Terrário
Montar um terrário ou miniterrário pode ser uma boa forma de conexão com a natureza em um espaço fechado. Geralmente criado em um recipiente de vidro, reproduz um ecossistema em equilíbrio. Evangelista explica que o espaço funciona como uma miniestufa autossustentável, que pode receber espécies de samambaia, musgos, bromélias e outras plantas que gostam de sombra e umidade. “O terrário reproduz um microclima, onde as plantas respiram, realizam a fotossíntese e mantém um ciclo de água. É muito legal observar todo esse processo, que, além de interessante para a decoração dos ambientes, praticamente não precisa de manutenção”, ressalta.
2 – Bonsai
Cultivar pequenas árvores com a técnica oriental do bonsai é outra boa alternativa. São muitas as espécies que podem ser abrigadas em pequenos jardins em casas ou apartamentos. “É uma atividade lúdica e prazerosa, que certamente pode gerar uma boa recompensa psicológica. Várias espécies podem ser utilizadas, como ipê, pinheiro, cerejeira e também árvores frutíferas como pés de jabuticaba, figo e romã”, indica o pesquisador.
3 – Muros ecológicos e paredes verdes
Existem várias opções de plantas e gramíneas que se adaptam muito bem a paredes e muros, inclusive a sacadas de prédios. As pessoas podem comprar estruturas prontas, inclusive com sistemas de irrigação, ou fazer suportes caseiros para colocar pequenos vasos na vertical. Para montar uma cerca verde em casa, o especialista sugere a ora-pro-nóbis, planta típica da América do Sul que, inclusive, é comestível. “É uma alternativa bem interessante para dar vida a vários tipos de paredes externas”, enfatiza.
4 – Terraços verdes e hortas
Utilizar o terraço de casas e prédios para cultivar plantas é uma forte tendência na América do Norte e na Europa. A ideia, que também já possui muitos adeptos no Brasil, além de trazer beleza visual para ambientes geralmente pouco atrativos, costuma gerar conforto térmico, já que a vegetação é capaz de amenizar as altas temperaturas concentradas nos telhados. Nos terraços também é possível criar hortas com espécies de verduras e legumes. “Mesmo em espaços pequenos em quintais ou sacadas de apartamentos pode-se criar pequenas hortas em vasos com temperos e condimentos”, sugere Evangelista.
5 – Composteiras
Realizar a reciclagem de resíduos orgânicos em casa é outra forma de demonstrar conexão com a natureza. É perfeitamente possível reaproveitar cascas de frutas e legumes, além de diversos rejeitos alimentares, para produzir adubo. Com estruturas relativamente pequenas e higiênicas pode-se formar um rico ecossistema para reduzir o impacto do lixo e a emissão de gases de efeito estufa na atmosfera.
Estimativas do Instituto de Economia Aplicada (Ipea) indicam que mais da metade do lixo doméstico é orgânico e, portanto, pode ser utilizado para produzir húmus. “Ao final do processo você terá um adubo de boa qualidade para utilizar na sua própria horta e nas plantas em geral. “É importante ressaltar que as composteiras com minhocas não emitem mau cheiro, não transmitem doenças ou oferecem qualquer risco à saúde humana. Você terá a oportunidade de acompanhar um ciclo completo de vida natural dentro de casa”, explica o professor.
6 – Plantas atrativas para abelhas e pequenos pássaros
As plantas também podem atrair abelhas, aves, entre outros insetos e pequenos animais. Algumas espécies, como a margarida e o girassol, podem abrigar abelhas nativas pequenas e sem ferrão, como jataí, mirim, mandaçaia e tubuna. É possível até ter uma pequena colmeia, formando jardins de mel dentro de casa. “As plantas também atraem pequenos pássaros, como os beija-flores. Para isso, as flores vermelhas são as mais indicadas, como bromélias, princesas-do-abismo e brincos-de-princesa”, sugere Evangelista.
O professor explica que aqueles que têm um espaço maior em casa ou mesmo a possibilidade de utilizar a calçada para o plantio, podem optar por pequenas árvores frutíferas. Palmeiras, como butiá e o jerivá, costumam atrair pássaros como o sanhaço, papagaio e periquito. “Existem palmeiras de variados tamanhos e tipos, mas no geral não são árvores grandes, que não causam danos às calçadas, produzem flores que atraem abelhas e, na fase de frutificação, são importantes para diferentes espécies de animais”, comenta o pesquisador.
O avanço da ciência cidadã
O especialista da RECN ressalta que o interesse do cidadão comum por temas ligados à ciência e à natureza está em alta. Para ele, a observação dos fenômenos naturais, o cuidado com as plantas e a preocupação real com a nossa pegada ambiental estão conectados e trazem muitos aprendizados. O movimento da ciência cidadã contempla iniciativas de observação da fauna e da flora em parques, a participação voluntária na coleta de dados para pesquisas, a produção sustentável na agricultura, entre outras iniciativas.
Muitas plataformas colaborativas e com informação de qualidade estão disponíveis atualmente para auxiliar os interessados em participar desse movimento. A gerente de Educação e Engajamento da Fundação Grupo Boticário, Thaís Machado Gusmão lembra que a natureza está mais perto do que muitos imaginam. “Podemos ter esse contato no quintal, nas plantas da sacada, na praça do bairro, nas nuvens, na praia, na chuva, ao ouvir e observar aves, enfim, em várias situações que nos cercam e, por vezes, não prestamos a devida atenção”, conta. “Essas experiências simples também contribuem para ampliar a compreensão sobre a importância do meio ambiente para a nossa vida, despertando um senso de pertencimento, que também fortalece a responsabilidade de cada um para cuidar do nosso patrimônio natural e protegê-lo”, finaliza Thaís.
Soluções baseadas na Natureza
Ampliando a escala para os espaços públicos, as plantas podem contribuir para a solução de grandes desafios urbanos, como enchentes e calor extremo. A infraestrutura verde, uma das aplicações das Soluções baseadas na Natureza (SbN), vem sendo usada com sucesso em diferentes regiões do mundo. Por meio da implantação, manutenção ou recuperação de áreas verdes em pontos estratégicos das cidades, é possível criar um sistema natural capaz de absorver a água da chuva, reduzir ondas de calor e até filtrar sedimentos do solo, melhorando a qualidade da água para o abastecimento das cidades com menores custos e mais saúde para a população.