Em dias de Maio Amarelo – mês dedicado à prevenção contra acidentes no trânsito -, o Instituto SOS Pantanal, a Chalana Esperança/Instituto Espaço Silvestre, o Instituto LiBio e Fridays for Future realizaram nesta segunda-feira, 15, uma intervenção coletiva em frente à sede do Departamento Nacional de Infraestrutura (DNIT) de Campo Grande (MS). Durante os últimos meses, enquanto atravessavam as estradas do Estado para cumprirem suas agendas de conservação no bioma, essas instituições encontraram e coletaram algumas das muitas carcaças de animais vítimas de atropelamento na BR-262 no trecho que liga Campo Grande a Corumbá, para expô-las na frente da representação estadual da autarquia federal.
Após a manifestação os participantes foram recebidos no gabinete do superintendente do DNIT, Euro Nunes. “Ele nos disse que está comprometido em promover obras que mitiguem a incidência de atropelamentos e acidentes, que a BR-262 é uma prioridade e que aguarda autorização do Ibama para começar a agir. Já estamos encaminhando solicitação para o Ibama questionando sobre o que falta para este processo ser aprovado. Vamos até o fim para que essas medidas saiam do papel”, contou biólogo e diretor de Comunicação e Engajamento do Instituto SOS Pantanal, Gustavo Figueirôa.
A ação, que conta com o reforço visual de enormes outdoors instalados na cidade sobre a iniciativa, bem como a distribuição de adesivos e material educativo para motoristas, dá início à campanha “Estradas Seguras Para Todos”, que chama a atenção para um problema crescente: as colisões entre veículos e animais silvestres nas estradas nacionais que ceifam a vida de animais e pessoas todos os anos. Por ano, cerca de 475 milhões de vertebrados são vítimas de atropelamento no Brasil, causando um alto impacto ambiental e acelerando o processo de extinção de diversas espécies ameaçadas.
O problema vai além do impacto à biodiversidade, pois envolve a segurança das estradas e de seus usuários. Segundo o Centro Brasileiro de Ecologia e Estradas (CBEE), cerca de mil pessoas morrem no Brasil por ano em decorrência de acidentes envolvendo colisão com a fauna em rodovias. Além das perdas de vidas humanas e de animais silvestres, os acidentes causam prejuízo para os cofres públicos e privados. Apenas no Estado de São Paulo, esse tipo de ocorrência gera um prejuízo de R$ 56 milhões por ano.
Além disso, o impacto ambiental gerado pelos atropelamentos é altíssimo e está acelerando o processo de desaparecimento de diversas espécies ameaçadas no Brasil, diminuindo a taxa de crescimento populacional, consequentemente afetando o equilíbrio dos ecossistemas. Essas colisões, que resultam diretamente na mortalidade de animais, põem em evidência a urgência em se adotar ações efetivas para garantir a segurança nas estradas tanto para pessoas quanto para os animais.
Ações como a construção de passagens de fauna (inferiores e superiores), o cercamento de trechos da estrada, a instalação de radares em pontos específicos e sinalizações mais eficientes, entre outras medidas, podem reduzir em mais de 80% estes acidentes. E isso é o que precisa ser urgentemente feito ao longo da BR-262, conhecida como Rodovia da Morte do Pantanal Sul. Nona maior rodovia do país, com 2.213 km de extensão, a BR-262 interliga Espírito Santo, Minas Gerais, São Paulo e Mato Grosso do Sul, é gerida pelo DNIT e, principalmente no trecho que corta o Pantanal, acumula elevados índices de atropelamento de animais.
Segundo estudos publicados por pesquisadores do tema, em três anos de monitoramento foram registradas a morte de 6.500 animais, entre eles 316 eram de espécies ameaçadas de extinção, como o lobo-guará, o tamanduá-bandeira e a anta. Cerca de metade desses animais era de porte grande, ocasionando acidentes graves para vidas humanas, e a maioria das colisões (90%) ocorre durante a noite, quando há maior atividade da fauna e menor visibilidade da pista. A pesquisa também aponta que a realidade é ainda pior do que vemos porque menos da metade dos animais mortos é contabilizada, pois a maioria dos animais, feridos pelas colisões, tentam fugir do local e morrem minutos depois, já longe da rodovia. Seus corpos nunca são encontrados ou contabilizados. A frequência desses acidentes também é assustadora: a cada três dias, dois tamanduás-bandeira morrem somente neste trecho da BR-262, o que tem reduzido pela metade o crescimento de sua população.
O problema persiste em toda a malha rodoviária estadual de Mato Grosso do Sul e é agravado pela expansão crescente das obras nas estradas que aumentam o fluxo de carros e caminhões em áreas de concentração de fauna silvestre. De 2015 a 2022, o Fundo de Desenvolvimento do Sistema Rodoviário do Estado de MS (Fundersul) investiu R$ 4,75 bilhões em implantação, asfaltamento e reformas de rodovias. Não há informação sobre qual fração, se alguma, deste recurso foi utilizado para mitigação de colisões veiculares com fauna silvestre.
Outro problema que a campanha “Estradas Seguras Para Todos” chama a atenção é sobre o programa do governo sul-mato-grossense “Estrada Viva”, que prevê monitoramento e ações de redução de atropelamento de animais selvagens nas rodovias estaduais. Apesar de ter sido lançado oficialmente em 2015, pouquíssimas ações mitigatórias foram realizadas. Em 2021, em uma parceria entre o Governo do Estado do Mato Grosso do Sul e diversas instituições públicas e privadas, foi lançado dentro do programa o “Manual de Orientações Técnicas para Mitigação de Colisões Veiculares com Fauna Silvestre nas Rodovias Estaduais do Mato Grosso do Sul”, com o fim de “embasar tecnicamente as empresas contratadas para elaborar os projetos viários no Mato Grosso do Sul”. Porém, pesquisadores da área relatam que não têm visto mudanças efetivas e salientam a falta de transparência sobre dados e recursos gastos. “É importante lembrar que estes acidentes ameaçam também a vida humana. O Mato Grosso do Sul, por exemplo, entre abril de 2013 e novembro de 2018 registrou 470 atropelamentos de anta em 32 rodovias estaduais. Neste período, foram 55 pessoas feridas e 23 óbitos resultantes destas colisões com antas. Além do risco à vida e à integridade física dos motoristas, os acidentes também provocam prejuízos materiais. Motoristas que cumprem suas obrigações legais e fiscais, mantendo seus carros revisados, com IPVA em dia, têm veículos danificados por conta da negligência e inação do poder público. Esta falta de vontade política e investimento tem custado caro aos motoristas e à vida silvestre. E nós, na condição de cidadãos e biólogos da conservação, estamos cansados de pagar esta conta”, afirma a coordenadora geral da Chalana Esperança / Instituto Espaço Silvestre, Luciana Leite.
“É desolador assistir tantos animais atropelados nas estradas todos os dias. Em três anos de monitoramento, em apenas 15% das estradas que cortam o MS foram mais de 12 mil animais mortos. O pior é saber que esse número é subestimado, pois mais da metade dos animais morrem longe da pista e raramente são encontrados. Já passou da hora de o poder público implementar as medidas de mitigação para evitar que nossa fauna continue sendo exterminada”, diz a presidente do Instituto Libio, Raquel Machado.
Segundo o ativista do movimento Fridays for Future Brasil, Gabriel Adami, “as pessoas não podem mais aguentar caladas a pavimentação das rodovias sem as devidas medidas de mitigação no MS”. Segundo ele, “temos de dar um basta nessa tragédia e o ato em defesa de Estradas Seguras Para Todos é, justamente, uma das vozes coletivas que se propõe a isso, a escancarar o problema por meio da mobilização da sociedade civil”.
“Esse problema é sistêmico, não se limita apenas à rodovia BR-262. Diversas outras estradas federais e estaduais pelo Mato Grosso do Sul acumulam acidentes envolvendo a fauna silvestre. Se o poder público não se sensibiliza com os milhares de animais mortos todos anos, deveriam ao menos se preocupar com as inúmeras vidas perdidas nestas rodovias”, sintetiza o biólogo e diretor de Comunicação e Engajamento do Instituto SOS Pantanal, Gustavo Figueirôa.
Movimento #EstradasSegurasParaTodos
De acordo com os idealizadores da campanha “Estradas Seguras Para Todos”, o primeiro passo é trazer à tona, por meio das carcaças dos animais mortos, essa infeliz realidade que se estende por centenas de quilômetros na BR-262, justamente para se poder exigir a destinação dos recursos já existentes na implementação das melhorias. Uma carta assinada por mais instituições e coletivos que juntos somam mais de 50 organizações foi entregue para o superintendente do DNIT, que se comprometeu a responder oficialmente em breve. Acesse aqui à carta na íntegra
O movimento lançou também um abaixo-assinado para coletar assinaturas e endossar o apelo ao poder público: change.org/
Um segundo momento, porém não menos importante, é chamar atenção para o problema sistêmico em outras rodovias que cortam o Mato Grosso do Sul, muitas delas estaduais. O Estado já possui um programa que, de acordo com o próprio nome, preconiza estradas VIVAS. Porém, falta ação e transparência. Nesse sentido, essas vias de circulação ainda seguem sendo um matadouro a céu aberto.
Sobre o Instituto SOS Pantanal Fundado em 2009, o Instituto SOS Pantanal é uma instituição sem fins lucrativos que promove a conservação e o desenvolvimento sustentável do bioma Pantanal por meio da gestão do conhecimento e da disseminação de informações sobre o ecossistema para governos, formadores de opinião, comunidades, fazendeiros e pequenos proprietários de terra da região, assim como à população em geral. Tem por missão, ainda, atuar permanentemente em prol da conservação da biodiversidade e dos recursos naturais.
Site: https://www.sospantanal.org.br Instagram: @sospantanal Facebook: institutosos.pantanal |
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