A infância e adolescência são fases da vida marcadas por transformações físicas e de comportamento. Nesse período, eles buscam aceitação e inclusão social. Isso pode gerar sentimento de insegurança, estresse e angústia. Essas emoções precisam ser discutidas e devidamente gerenciadas para evitar transtornos mentais. De acordo com a Organização Pan-Americana de Saúde (Opas), problemas relacionados a saúde mental são responsáveis por 16% da carga global de doenças e lesões em pessoas com idade entre 10 e 19 anos. Os sintomas aparecem principalmente aos 14 anos, mas a maioria dos casos, ainda segundo a Opas, não é detectada e tratada, o que pode se agravar na fase adulta, prejudicando a saúde física e mental e limitando futuras oportunidades.
É necessário ter a infância e adolescência saudáveis para prevenir transtornos futuros, afinal são nessas fases da vida que os hábitos sociais e emocionais são desenvolvidos. Por isso, a importância de evitar a exposição a experiências adversas, de abuso, violência ou outros fatores de risco que possam afetar o bem-estar e a saúde mental de crianças e adolescentes.
A discussão do transtorno mental nesse público entrou em pauta após dois jovens atacarem uma escola em Suzano, em São Paulo, matando oito pessoas e cometendo suicídio em seguida. Apesar da projeção do momento, a saúde mental nessa faixa etária já deixava especialistas em alerta após observar um crescimento nos casos de automutilação nesse público. “Percebemos que os adolescentes estão buscando a automutilação para aliviar a angústia que enfrentam. Eles não conseguem nomear os próprios sentimentos e não sabem enfrentar situações difíceis. Com isso, recorrem a automutilação como resposta ao sofrimento deles. É uma forma de comunicação e pedido de ajuda”, destaca a psicóloga Daniela Araújo, coordenadora do Núcleo InfantoJuvenil da clínica Holiste.
É essencial observar os sinais apresentados pela pessoa que apresenta algum tipo de transtorno mental. São mudanças de comportamento, atitudes agressivas, isolamento, dificuldade em manter convívio social, queda no rendimento escolar e consumo excessivo de internet. Caso esses alertas sejam percebidos, é necessário dialogar e tentar entender o que está acontecendo, além de buscar um profissional especializado.
Se o transtorno não for detectado e tratado, o jovem pode se ferir ou agredir terceiros. Ainda segundo estudos desenvolvidos pela Opas, o suicídio é a terceira principal causa de morte entre adolescentes de 15 a 19 anos. É nesse contexto que desafios como Baleia Azul e Momo têm conquistado espaço e preocupado os pais.
Esses males ganham mais terreno no mundo contemporâneo, em que as relações estão mais fragilizadas. “A atualidade é muito alimentada pela virtualidade, as relações não são construídas de forma consistente. Com a formação fragilizada, os jovens ficam mais vulneráveis. Antes eles buscavam referência nas figuras de autoridades na família e escola. Agora, eles seguem o exemplo dos YouTubers, dos Gamers e de outros personagens do mundo virtual, deixando os mais expostos”, explica a psicóloga.
É importante destacar que os jogos e internet não são culpados de possíveis transtornos, mas a exposição excessiva é prejudicial. “As tecnologias e os games são apenas ferramentas, não há associações científicas destes com mudanças de comportamento se a presença dos pais proporcionar alternativas qualificadas para o lazer e outras atividades. Porém a cultura da vida condominial, a convivência com ambientes públicos impessoais como os shoppings, a insensibilidade ao sofrimento alheio e o conformismo com o fenômeno da violência pode condicionar a cínica relativização de valores morais e a perda do sentimento de compromisso público”, ressalta o psiquiatra da clínica Holiste Victor Pablo.
Como os adolescentes estão em desenvolvimento, são mais propensos a comportamentos impulsivos e a influência de sentimentos fervorosos. Por isso, é essencial limitar o tempo de exposição a tecnologia e jogos, além de oferecer outros conteúdos apropriados para a faixa etária. “As crianças e adolescentes não conseguem se dar limite, então é preciso que o limite venha de fora, dos pais. Se deixar eles vão buscar aquilo que gostam, até porque a tela do celular, computador ou videogame hipnotiza, fisga a atenção e a pessoa fica imerso naquele universo. Então é necessário propor outras atividades e apresentar mais opções de diversão, principalmente com contato direto com os pais, olho no olho, um momento para conversar. A brincadeira é uma ótima oportunidade para ensinar o filho a expressar suas emoções, a colocar para fora os sentimentos por meio de palavras”, acrescenta Daniela Araújo.