O Ministério da Economia defende a revisão da participação do Brasil em diferentes organismos internacionais. A falta de dinheiro é a justificativa do time de Paulo Guedes.
O movimento ocorre enquanto o país acumula dívidas com colegiados multilaterais e o Itamaraty faz alertas sobre o risco de perda de voto em entidades como a ONU (Organização das Nações Unidas).
Em análises sobre o tema, a equipe econômica identificou que o Brasil sofre desvantagem em alguns organismos e participa de certas entidades de forma redundante.
Entre os organismos que se enquadram nesse cenário estão o Focem (Fundo para a Convergência Estrutural do Mercosul) e o Fonplata (Fundo Financeiro para o Desenvolvimento da Bacia do Prata). Os dois órgãos demandam por ano mais de R$ 550 milhões.
O Focem entrou em operação em 2006 e faz os países com maior PIB (Produto Interno Bruto) do Mercosul ajudarem os demais. O dinheiro é destinado principalmente a obras de infraestrutura.
Para a equipe econômica, o Brasil paga muito ao fundo e recebe pouco. Dos US$ 100 milhões (R$ 567 milhões) a serem depositados no Focem anualmente, o país precisa aportar 70%; a Argentina, 27%; o Uruguai, 2%; e o Paraguai, 1%. Por ano, são R$ 396 milhões.
Embora sejam os menores contribuintes, Paraguai e Uruguai ficam com a maior parte dos recursos –48% e 32%, respectivamente. Já Brasil e Argentina podem sacar apenas 10% anualmente.
Para o Ministério da Economia, a participação no Focem não é vantajosa pois demanda recursos sem retornos produtivos. Além disso, o critério de envio e retirada de dinheiro desconsidera outros indicadores além do PIB.
Se considerado o PIB per capita, por exemplo, Argentina e Uruguai são mais desenvolvidos doque o Brasil –e, mesmo assim, têm condições mais vantajosas no Focem.As análises são feitas enquanto o país tem travado batalhas no Mercosul.
Além de ter baixado tarifas de importação se antecipando a um consenso sobre o tema, o Brasil defende que membros do bloco sejam liberados para fazer acordos comerciais de forma independente. A pauta é defendida pelo Uruguai e tem respaldo do governo brasileiro. A Argentina é contra.
No caso do Fonplata, a conclusão é similar à do Focem. O Brasil é o país que menos recebe empréstimos, mas tem maior compromisso de pagamentos. O fundo, estabelecido por Argentina, Bolívia, Brasil, Paraguai e Uruguai em 1977 para emprestar aos signatários, demanda do Tesouro Nacional US$ 27,6 milhões (R$ 156 milhões) por ano.
Ao todo, o país precisa aportar no fundo um total de US$ 100,6 milhões (R$ 570,4 milhões) até 2026. Em comparação, o Brasil recebeu em média US$ 16,4 milhões (R$ 93 milhões) anualmente em empréstimos nos últimos quatro anos.
Por outro lado, o Ministério da Economia conclui que, em alguns órgãos, a participação do país é vantajosa mesmo demandando altos valores dos cofres brasileiros. É o caso da CAF (Corporação Andina de Fomento), que funciona como um banco multilateral e do qual o Brasil participa desde 1995.
Embora a CAF exija um total de US$ 445 milhões (R$ 2,5 bilhões) do Brasil de 2022 a 2026, o país recebe mais em empréstimos. Em 2019, por exemplo, a CAF enviou US$ 1,1 bilhão (R$ 6,7 bilhões) em crédito ao país.
Além disso, a CAF reúne países de forma abrangente e, inclusive, engloba nações que compõem Focem e Fonplata.
Em meio à restrição orçamentária, o Itamaraty também tem tentado demonstrar esforço para rever participações internacionais.
Recentemente, por exemplo, decidiu por se retirar do Sela (Sistema Econômico Latino-Americano e do Caribe), que tem sede na Venezuela.
Outro movimento foi feito na relação com órgãos internacionais. Guedes comunicou ao FMI (Fundo Monetário Internacional) que o governo não tinha mais interesse em um escritório local do fundo. O FMI decidiu, então, se retirar do país.
O Ministério da Economia espera que a análise aprofundada sobre a participação em organismos internacionais seja feita de forma mais ampla pelo governo para racionalizar o uso dos recursos.
Para isso, vai propor também a recriação de uma comissão interministerial diretamente ligada à Presidência da República para rever a participação em organismos, fundos e instituições financeiras internacionais.
O órgão, que agora seria formado por integrantes do Ministério da Economia e do Itamaraty, foi criado em 2016 (no governo Dilma Rousseff, do PT) com composição mais ampla.
O grupo foi eliminado em 2019, já no governo Jair Bolsonaro (PL) por um decreto que promoveu uma extinção em massa de colegiados.
Reportagem da Folha publicada em novembro mostrou que, no total, o Itamaraty estima que o país esteja devendo R$ 8,8 bilhões a organismos internacionais.
Folhapress-Brasília