“Eu tive depressão no ano passado, sofri muito com isso. Na época, eu estava no hotel e quis me suicidar. Me veio pensamentos ruins e eu queria saber como era me jogar do prédio. Então, eu gritei por socorro, pela minha mulher, pelo doutor Tanure, Diego Ribas, Diego Alves, Filipe Luís, o Rafinha, o Marcos Braz também. Eles me fizeram ser querido, ser abraçado. Eles tiveram um cuidado comigo, que ninguém antes tinha feito”. Esse relato impactante do atacante Rubro Negro, Michael, despertou discussões sobre a importância de uma rede de apoio estruturada e atuante na prevenção do suicídio.
Depressão e pensamentos suicidas: uma dor silenciosa que acomete milhares de pessoas ao longo do mundo. Pensar em suicídio é, infelizmente um processo inerente à condição humana. A dificuldade em encontrar soluções imediatas para os problemas, seja de que natureza for, faz com que o indivíduo se sinta fragilizado emocionalmente, a ponto de gerar uma sufocante necessidade de eliminar a dor a qualquer custo. Desta maneira nasce a urgência em tirar a própria vida, em uma tentativa de alívio às pressões externas.
Michael relata ter vivido esse pesadelo em 2020, onde os pensamentos suicidas, motivados por uma depressão profunda, tiraram sua paz e pintaram seus dias de cinza. Mas felizmente, foi com o apoio do Staff do Flamengo, do técnico Jorge Jesus, dos amigos e da esposa que ele conseguiu ter consciência de si mesmo e mudar o cenário. Além claro, da grande ajuda e acompanhamento de profissionais especializados em saúde mental.
O jogador rubro negro, através de seu relato corajoso, descortina dados de uma estatística infeliz sobre o suicídio no Brasil. Os números são assustadores e refletem o que todos sabemos, mas nem sempre paramos para avaliar: nossa sociedade precisa se mobilizar para tratar as questões ligadas a este episódio de forma cautelosa, objetivando eliminar os tabus contidos no tema. Temos atualmente, conforme pesquisas, 15 a 18 mortes por suicídio a cada 100 mil pessoas, das quais a grande maioria, é composta por jovens entre os seus 14 a 21 anos. Em média, dois adolescentes tiram a própria vida por dia, segundo pesquisas. Mas em geral, o suicídio pode afetar qualquer pessoa e nossos adultos estão também entre os maiores candidatos, atingindo um percentual em torno de 48% na faixa etária de 35 a 55 anos. Mortes das quais, 90% poderiam ser evitadas, se a oferta de ajuda de saúde mental e de acolhimento para pessoas em risco de suicídio, fosse mais efetiva.
O desejo de morrer e dar fim à própria vida é um gesto de autodestruição e autoflagelo. Sintomas como a depressão, ansiedade, fracasso, fobias, humilhações e culpas, são certamente, potenciais sinalizadores de que algo está errado e que sentimentos conflituosos foram despertados por gatilhos diversos. Por não conseguir apoio ou sabedoria para lidar com esses conflitos emocionais, o indivíduo entra em um processo neurótico e interno, onde não consegue ter a clareza de que tirar a vida significa uma solução imediata para um problema temporário. Porém, o suicídio não está necessariamente ligado a uma doença mental, na verdade é um momento de desequilíbrio que a pessoa está passando e que, somente com o acolhimento correto, uma escuta ativa, um acompanhamento por um profissional de saúde mental qualificado, além de apoio familiar e de amigos, poderá obter um desfecho menos trágico.
Existem infinitos motivos para um ser humano estar desesperançado o suficiente a ponto de querer acabar com a própria vida; em geral, pode ser por luto, depressão, transtorno de ansiedade, outras questões mentais, violência sexual, abuso durante a infância, problemas financeiros, fim de relacionamento, bipolaridade, bullying, ou outra questão. E como essa rede de apoio pode ajudar? De que forma podemos acolher um suicida em potencial? Como perceber atitudes que possam culminar nesta tragédia? A grande verdade é que nosso olhar deve estar voltado para qualquer sintoma característico em relação a quem possa vir a cometer o ato.
No entanto, a grande realidade é que, muitas vezes quem está prestes a se suicidar não demonstra isso claramente; motivo pelo qual devemos ter a sensibilidade em oferecer ajuda diante de uma crise. Saber ouvir e permitir que os sentimentos sejam externados e verbalizados, sem julgamentos ou minimizações, é a melhor saída. Em alguns momentos, a vida pode parecer nos envolver em um turbilhão de emoções, mas não podemos nos entregar a angústia e ao desespero, e assim tirar a vida, pois toda tempestade passa e o sol volta a brilhar. O autoconhecimento nos fortalece e fornece subsídios para que o enfrentamento a questões psicológicas e traumáticas não afetem o nosso emocional a ponto de gerar desequilíbrios que possam vir a nos levar a cometer um ato tão conclusivo, que nos impeça de enxergar o mundo e suas adversidades. Um diálogo aberto, respeitoso, empático e compreensivo pode fazer a diferença. A escuta ativa deve sempre estar presente nesses diálogos. Empatia, funciona muito nestas horas. Ouça empaticamente. Tente se colocar no lugar da pessoa. A dor não faz qualquer distinção. Todos podem ser acometidos por esse sentimento, independentemente de idade, ideologias, gênero, orientação sexual, nacionalidade, classe social e etnia. E quando essa sensação de desespero e desamparo é profunda demais, a ponto de não ser suportada, os pensamentos suicidas ganham força. Esse fardo é tão pesado que pode fazer com que a pessoa acredite que o suicídio seja a única maneira de se livrar dos problemas, julgando-se incapaz de suportá-lo e enxergando a vida como algo sem significado.
Enfim, fortaleça essa rede de apoio, ela é fundamental para salvar vidas e resgatar indivíduos que acreditam que nada mais vale a pena. Assim como aconteceu com o jogador Michael, várias pessoas podem estar em adoecimento psíquico. Portanto, acolha, demonstre apoio, tenha empatia e fique atento aos sinais que estão sendo emitidos, demonstrando que algo está errado. O equilíbrio emocional é primordial para afastar qualquer tipo de pensamento ruim. Não deixe para o dia seguinte, se você pode acolher, ouvir e ajudar alguém em sofrimento. Muitas vezes, temos pessoas a nossa volta que estão sorrindo por fora, mas internamente, estão com o psicológico abalado e fragilizado e já não suportam mais a dor. Entendem que a melhor maneira de MATAR e eliminar esse sentimento é tirando a própria vida. Uma solução definitiva para excluir problemas temporários. Ou seja, saúde mental é coisa séria, não ignore os sinais de pedido de socorro. A melhor arma no combate a este mal é o combo: afeto, empatia, apoio emocional e a estruturação de uma rede de apoio acolhedora e presente.
Dra. Andréa Ladislau
Psicanalista
Andréa é Membro da Academia Fluminense de Letras – cadeira de número 15 de Ciências Sociais; Administradora Hospitalar e Gestão em Saúde; Pós Graduada em Psicopedagogia e Inclusão Social; Professora na Graduação em Psicanálise; Embaixadora e Diplomata In The World Academy of Human Sciences US Ambassador In Niterói; Professora Associada no Instituto Universitário de Pesquisa em Psicanálise da Universidade Católica de Sanctae Mariae do Congo; e Professora Associada do Departamento de Psicanálise du Saint Peter and Saint Paul Lutheran Institute au Canada, situado em Souhaites.