O lenço preto e o cartaz escrito “luto” deixavam incrédulos quem passava em frente à barraca do chaveiro Nelson Mendes da Silva, 63 anos. “Meu Deus não acredito, uma pessoa tão boa”. “Que crueldade fizeram com ele”. O senhor que trabalhou por mais de 50 anos no Beco da Farmácia fazendo chaves e amigos na Avenida Sete, morreu nesta sexta-feira (21) – 19 dias depois de ser atacado.
Há 20 dias, seu Nelson deu entrada na emergência do Hospital Geral do Estado (HGE) vítima de um espancamento durante um assalto na Piedade. O suspeito de tê-lo espancado é Natanael Silvério de Souza, o ‘Soldado’, que está preso preventivamente, segundo a Polícia Civil. Moradores dizem que ele é usuário de drogas conhecido na região, inclusive pela própria vítima. Nelson foi enterrado ontem à tarde no Cemitério Quinta dos Lázaros.
“Conhecia ele há mais de 40 anos. Uma pessoa boa. Se a gente não tinha o dinheiro na hora, pagávamos depois. Que covardia fizeram com ele”, declarou a designer de moda Celenir Oliveira, 68, parada defronte à barraca na manhã deste sábado (22).
Ao lado dela, o porteiro Jorge Urbano, 70, também lamentou a morte brutal do amigo. “Ele tomou várias porradas na cabeça. O que dizem é que ele reagiu, mas nada justifica”, comentou.
O crime aconteceu no dia 2 de deste mês, Dia Nacional do Samba. De acordo com moradores e comerciantes da região, Nelson estava no Centro apreciando um dos eventos que marcava a passagem da data. “Ele estava sozinho e foi atacado quando voltava para casa”, contou uma ambulante amiga de Nelson e que trabalha na Rua da Forca, em frente à Praça da Piedade.
Perto de casa
Nelson foi espancado na Rua Direta da Piedade, a poucos metros do Edifício Venezia, onde morava. “Foi um único rapaz que o atacou com um pedaço de pau. Nelson reagiu ao assalto”, declarou uma ambulante. Ainda de acordo com ela, o criminoso é um usuário de drogas conhecido na região e foi visto há dois dias perambulando no Largo da Piedade. Questionada quanto ao nome do criminoso, ela preferiu calar-se.
“É um viciado acostumando a roubar pelo Centro. Vivia anda por aqui, entre nós. O próprio Nelson o conhecia, por ser antigo por aqui. Talvez seja até por isso que ele (Nelson) tenha reagido”, disse a ambulante.
O CORREIO esteve no Edifício Venezia, em busca de parentes de Nelson. “Eles não estão aqui. O apartamento está vazio desde o dia do episódio”, disse o porteiro do prédio, que emendou: “Ficamos muito arrasados com o que aconteceu com ‘Seu Nelson’. Que morte horrível. Uma pessoa tão boa. Não merecia um fim desse”.
Nelson trabalhava copiando chaves desde os 11 em um dos becos da Rua Carlos Gomes – importante rua comercial em Salvador, paralela à Avenida Sete. Era conhecido como o Baixinho Chaveiro e, durante todo o seu dia, respondia aos cumprimentos de quem passava. Homens, mulheres, crianças, jovens e idosos paravam para apertar sua mão e conversar.
Filho único, criado por um pai severo, aprendeu o ofício em Limoeiro, Pernambuco. Perdeu a mãe muito cedo e, aos 15 anos, fugiu para Salvador. Aos 25 anos, entrou no curso de Economia da Universidade Católica do Salvador (UCSal), porém, com a chegada dos filhos, não concluiu. No mesmo ponto desde que começou a fazer chaves na capital soteropolitana, abria o ponto por volta das 8h30 da manhã.
Correio24horas