Quem olha a Baía de Todos os Santos pode não imaginar que do outro lado do mar, tem muito mais do que belas praias. Localizado em Vera Cruz, na Ilha de Itaparica, o Quilombo do Tereré guarda história, cultura e tradição, alinhado a questões étnicas. O local também tem a característica marcante da produção rural, estabelecida no cultivo da mandioca e do dendê, que garante renda para parte das 487 famílias que moram lá.
Toda essa diversidade, que é peculiar ao Tereré, foi visitada, nesta segunda-feira (12, por uma comitiva de jornalistas internacionais que dialogam com o universo da agricultura familiar e da alimentação saudável, e chefs de cozinha, que puderam acompanhar de perto o processo produtivo da farinha de mandioca, beiju e extração do dendê.
Contemplado no Edital Quilombola, do Bahia Produtiva, projeto executado pela Companhia de Desenvolvimento e Ação Regional (CAR), empresa vinculada à Secretaria de Desenvolvimento Rural (SDR), a Associação do Quilombo do Tereré, receberá um aporte de R$377 mil para requalificação da casa de farinha de mandioca que hoje funciona de maneira artesanal: “Essa modernização vai nos ajudar muito, sairemos da produção de 1000 quilos por dia para 50 mil”, informou Anatelson das Neves, presidente da Associação.
A agricultora Maria Nilza dos Santos mora no quilombo desde 1984. De lá para cá, segundo ela, sempre plantou mandioca, colheu, raspou, sessou e torrou. Agora, com mecanização alinhada ao processo de beneficiamento: “será uma maravilha, pois nós necessitamos mesmo, vamos aumentar a produção e ter mais renda com certeza absoluta”, celebrou.
Olhar de fora
Depois de desembarcar na capital paulista para participar do Mesa São Paulo 2018, maior evento de gastronomia do Brasil, que aconteceu entre os dias 9 e 11 de novembro, os jornalistas de seis nacionalidades diferentes (Colômbia, Espanha, EUA, Itália, Portugal e França), vieram conhecer in loco um pouco do sabor da Bahia, que tem como protagonista os ingredientes da agricultura familiar.
“O jornalista não sabe a origem do produto, ele está muito mais acostumado a entrar num restaurante e experimentar um prato finalizado e olhar a técnica e o gosto, mas sem saber qual a história que tem por de trás. Aproximá-los da base e mostrar como tudo é feito o entendimento dele é outro”, salienta Georges Schneider, um dos diretores da Revista Prazeres da Mesa.
Rita Machado, repórter do jornal Português Público, observou que a experiências vivenciadas serviram de aprendizado para se inteirar do ciclo que o alimento passa até chegar à mesa: “Esta visita é importante para nós jornalistas, para sabermos de onde vêm os produtos de origem que são usados em restaurantes de luxo, que tivemos em São Paulo, pois lá falaram muito do que vimos hoje aqui no Tereré. O que eu achei mais interessante nessa viagem foi conhecer as pessoas, conhecer a rotina, ver os processos manuais e depois provar a comida”.
O dendê extraído de maneira artesanal no Tereré foi um dos ingredientes da moqueca de peixe e camarão, preparado pelo chef de cozinha, Fabrício Lemos, que serviu os pratos com arroz branco e farinha fresquinha, “torradinha da hora” feita no Quilombo para os visitantes: “Nossa missão é pegar os ingredientes simples e deixar que toda essência dele não se perca e vá até o final. O objetivo é aproximar os agricultores familiares do consumidor final, a gente fala de onde vem o produto, indica onde encontrar e qual cooperativa beneficiou. As pessoas vêm pulando fases, e o artesanal, que tem todo esse sabor, fica esquecido “, sinalizou.
Foto: André Frutuoso